terça-feira, 8 de junho de 2010

Inovação Colaborativa e o Poder do Puxar


Inovação Colaborativa e o Poder do Puxar

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Em meio a uma crise econômica sem precedentes, executivos se tornam obcecados com metas de desempenho de curto prazo tais como o corte de custos, o aumento de vendas e do crescimento da fatia de mercado. Enquanto isso, economistas recorrem a dados estatísticos como o crescimento do PIB, níveis de desemprego, e as variações da balança comercial para avaliar a saúde do ambiente de negócios.
Nada de novo no front, exceto que o foco nas métricas tradicionais frequentemente impede que se enxergue as forças de mudança de longo prazo que corroem as fontes normais de valor econômico. Na realidade, “normais” pode ser uma coisa do passado, pois até quando a economia volta a se aquecer, a rentabilidade das empresas tem voltado a ficar sob pressão. O fato é que algumas tendências iniciadas há décadas estão modificando o ambiente de negócios nas suas bases, apoiadas por uma infraestrutura digital construída sobre o ritmo exponencial sustentado das melhorias de desempenho em computação, memória e banda de comunicações. E essa infraestrutura não se constitui apenas de bits e bytes, pois envolve instituições, práticas, e protocolos que juntos representam, ao mesmo tempo, o arcabouço e a entrega da força crescente da tecnologia para servir aos negócios e à sociedade. Por mais concretas que pareçam tais tendências, há que se dispor de métricas apropriadas para que se possa avaliar o ritmo das mudanças, e até mesmo o impacto da largura de banda. Com esse propósito o Deloitte Center for the Edge (liderado por John Hagel III, John Seely Brown, e Lang Davison) publicou em Junho de 2009 um relatório intitulado “Measuring the forces of long-term change - The 2009 Shift Index” no qual define o “índice de mudanças” (em inglês, “The Shift Index”) como composto de três medidas caracterizadas por três ondas de mudança profunda – Fundamentos, Fluxo, e Impacto – além de 25 métricas que juntas quantificam o estoque, o ritmo e as implicações da mudança. Pode-se pensar no “The Shift Index” como um análogo da nova economia ao “Composite Index of Leading Indicators”, um índice da velha economia publicado mensalmente pelo Conference Board (responsável pelo índice de confiança do consumidor) usado para fazer previsões sobre o rumo dos movimentos da economia nos meses adiante.
Entre as observações relatadas no relatório da Deloitte, a que mais se destaca é a que diz que desde 1965 a rentabilidade econômica (em inglês, “returns on assets”, abrev. ROA) das empresas americanas experimentou um decréscimo de cerca de 75%, ao mesmo tempo em que se observou um acréscimo ainda que modesto em produtividade. E, ao que tudo indica, não há sinais de que essa tendência de declínio no ROA será revertida num futuro próximo.
Em palestra intitulada “Collaborative Innovation and a Pull Economy” proferida em 14/04/2010 no Stanford Technology Venture Program como parte do “Entrepreneurial Thought Leaders Lecture Series”, John Seely Brown, Co-Chairman do Deloitte Center for the Edge, e ex-Cientista-Chefe do Palo Alto Research Center (PARC) da Xerox, berço de inovações revolucionárias como o mouse e a “graphical user interface”, argumenta que a velha guarda dos negócios não é mais viável. Enquanto que, ao conseguirem galgar a inclusão no índice S&P 500, as empresas tinham uma certa garantia de longevidade, hoje em dia muitas sobrevivem naquela relação apenas cinco ou dez anos. Segundo Brown, o século XXI é qualitativamente diferente,  com novos mecanismos institucionais tecnológicos forçando novas práticas de negócios. É perfeitamente factível nos dias de hoje criar empreendimentos “baseados em garagem”, no melhor estilo de “startups do Vale do Silício” que há um tempo atrás demandavam altos custos de infraestrutura, com apenas dez pessoas e 50 mil dólares, que experimente crescimento e produtividade tão significativos quanto nunca dantes imaginados. Aos novos empreendedores urge tirar proveito das ferramentas avançadas tais como a computação nas nuvens e as mídias sociais para alcançar verdadeiro progresso a um ritmo antes impensável. O fato é que o crescimento exponencial da razão preço/performance do poder computacional, de memória, e de largura de banda tem levado a uma taxa de adoção da nova infraestrutura digital que é duas a cinco vezes mais rápida do que antigas infraestruturas tais como as redes elétricas e telefônicas.
No relatório mais recente sobre “The Shift Index” (“The 2009 Shift Index - Industry metrics and perspectives”, Novembro 2009), Hagel III, Brown, e Davison chamam à atenção para o fato de que uma análise do índice em diferentes setores da indústria mostra que há pouca correlação entre aumentos em produtividade e melhoria no ROA. Na verdade, algumas indústrias que têm experimentado as mais dramáticas melhoras em produtividade têm tido também a mais dramática erosão no ROA. Segundo os autores, a melhor estratégia para lidar com a erosão do desempenho reside na busca por um aproveitamento dos fluxos ubíquos de conhecimento que são criados e amplificados pela infraestrutura digital. Fluxos de conhecimento são tracionadores fundamentais do crescente poder dos clientes e do talento criativo. É preciso que as empresas criem valor econômico participando efetivamente nos fluxos de conhecimento e não simplesmente continuem a explorar estoques de conhecimento existentes através de uma maior eficiência econômica.
Não menos importante é a participação da força de trabalho nesses fluxos de conhecimento. Conforme o relatório, de 75 a 80 por cento da força de trabalho não tem paixão pelo trabalho que realizam diariamente, e isso é particularmente significativo dada a forte correlação entre a paixão do trabalhador e a participação mais ativa nos fluxos de conhecimento. E, nesse contexto, dada a importância cada vez maior dos fluxos de conhecimento, possivelmente a forma mais poderosa de inovação pode não ser a inovação tecnológica em si, mas sim a inovação institucional: repensar os papéis e os relacionamentos nas organizações de forma a melhor permitir a criação de fluxos de conhecimento e a participação neles, dando espaço à chamada inovação colaborativa com o suporte das tecnologias colaborativas e mídias sociais.
Nesse sentido, em seu mais recente livro, “The Power of Pull: How Small Moves, Smartly Made, Can Set Big Things in Motion” (Basic Books, Abril 2010), Hagel III, Brown e Davison argumentam que a tecnologia digital deu origem a um deslocamento de poder no mundo dos negócios: dos produtores de bens e serviços para as pessoas que os compram, e para os empregados talentosos das organizações que os emprega. Segundo os autores, o mecanismo propulsor desse deslocamento de poder é o que eles chamam de “puxar” (em inglês, “pull”). “O puxar nos permite a cada um de nós encontrar e acessar pessoas e recursos quando deles precisamos, ao mesmo tempo em que atrai para perto de nós as pessoas e os recursos que são relevantes e de valor, ainda que não estivéssemos sequer cientes de que eles existiam.” É como se o puxar propiciasse as condições para desatar as forças da atração, da influência e da “serendipity”, termo em inglês que significa “a capacidade de fazer descobertas importantes ao acaso”. Por outro lado, o “puxar” nos daria a capacidade de extrair de dentro de nós mesmos o insight e o desempenho necessários para atingirmos nosso próprio potencial de forma mais efetiva.  Enfim, “podemos usar o puxar para aprender mais rápido e traduzir esse aprendizado em desempenho que melhora rapidamente, não apenas para nós mesmos, mas para as pessoas com as quais nos conectamos – um círculo virtuoso do qual podemos participar.”
 
Ruy José Guerra Barretto de Queiroz, Professor Associado, Centro de Informática da UFPE

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